" Era tarde, muito tarde. Estava cansado. Havia dirigido o dia todo.
Precisava entregar a carga até a manhã seguinte. O “Bruto” replicava como se
entendesse que precisava me ajudar. Eu trocava as marchas e ele respondia com
potência. Somente a estrada não colaborava...buracos, lombadas, acostamentos
precários. A sinalização era deficiente, isso quando havia. Poucos
caminhoneiros se aventuravam por aquelas rodovias do país. Às vezes tinha a
impressão que estava sozinho no mundo. Logo á frente percebi que as coisas
iriam piorar. Um aviso improvisado alertava sobre um desvio por uma estrada
secundária, pois havia desmoronamento na via principal. Era só o que faltava
!...Mais adiante avistei uma placa azul com letras douradas sinalizando acesso
a uma pista dupla. Tinha asfalto negro com faixas amarelas que indicavam cada
trecho da estrada. Eu não acreditava no que estava vendo. O “Bruto” deslizava
como se estivesse sobre um tapete. Não havia ondulações nem lombadas.
A cada quilômetro deparava-me com
um telefone. Uma frota de caminhões lotara a estrada, porém todos seguiam organizados. As pistas largas fluíam às suas
margens, gramados verdes e arbustos floridos desenhavam a paisagem deixando a
estrada ainda mais linda. As placas azuis com letras douradas eram intercaladas
com placas verdes e letras brancas, vermelhas com letras amarelas, brancas com
letras pretas. Nunca havia visto nada parecido. Sem dúvida era uma experiência
nova. Comecei a observar os caminhoneiros que por mim passavam, eles nem
olhavam para o lado, sempre muito sérios.
Uma placa luminosa, com aparência estranha informava que havia um posto
de serviços a alguns quilômetros á
frente. Até que enfim... Eu já precisava parar mesmo. Quando lá cheguei, não
havia mais vagas no estacionamento. Tentei manobrar mas era impossível. Tentei
parar no acostamento, um guarda estranho com roupas antigas, soou um apito
avisando para que eu continuasse, pois ali não era o meu lugar. Percebi que os
caminhões que ali estavam estacionados eram antigos, alguns da década de 30 e
40, mas todos em excelente estado de conservação, pareciam ter
saído da fábrica naqueles dias.
Os trajes dos motoristas também eram diferentes e todos usavam chapéus.
Muitos deles se reuniram no estacionamento e ficaram me observando, alguns
tiraram o chapéu e até tentaram acenar, mas na velocidade em que eu estava, não
permitiu-me retribuir. Para minha alegria uma nova placa de cor clara com
letras marrom sinalizava que logo á frente havia um novo posto de serviços. Não
fiquei muito esperançoso, pois a mesma avisava que o local era somente
para atender automóveis de passeio.
Quando lá cheguei deparei com uma verdadeira exposição de carros antigos.
Todos tentavam estacionar. Os guardas apitavam gesticulando que eu acelerasse o
“Bruto”, para que não piorasse ainda mais o trânsito. E novamente deixei mais
um posto de serviços para trás.
Durante horas dirigi sem poder estacionar. Tive a oportunidade de ver
centenas de modelos de caminhões e automóveis dos últimos cinqüenta anos, que
circulavam naquela estrada. O tráfego era tão organizado que havia posto de
serviços para cada um deles. Notei que à medida que eu percorria quilômetros os
veículos iam mudando, surgindo mais novos, até que chegarem aos modelos atuais.
À distância uma placa iluminada sinalizava “Posto de Serviços para
Caminhões ano 2003” .
O estacionamento estava lotado, porém uma vaga me esperava. Dezenas de
caminhoneiros vieram me receber, pareciam ser todos meus amigos. Abraçaram-me,
os acompanhei até o interior do Posto. Contei-lhes que naquela estrada havia
presenciado uma verdadeira tela cinematográfica, vendo todos os tipos de
automóveis e caminhões antigos que já saíram de circulação há muito tempo.
Então retornamos até a beira da estrada, paramos para observar os caminhões e carros de passeio que
por ali passavam. Disseram-me que eu estava assistindo o milagre da vida.
Observe aquele caminhão, dizia um deles, é
modelo 2004. Veja aquele outro, 2005, o outro é novíssimo 2006.
À medida que iam passando surgiam automóveis inovadores, modernos, 2010,
2011, 2025,...Daqui você poderá observar a evolução da tecnologia, dizia um
outro.
- Mas será que nossos governantes
pensaram nos homens que irão conduzir estás máquinas?
Ele trabalhará dia e noite, viajará por estradas ruins, mal sinalizadas,
esburacadas e sem acostamentos. Provocará muitos acidentes, principalmente pelo
desenvolvimento constante de motores tão potentes, que exigem dos motoristas
maior conhecimento e muito treinamento, o que nem sempre é exigido pelas leis
que não acompanham a velocidade da tecnologia e que serão os responsáveis por
todos os outros pais de famílias que por aqui
passarão, e que não saberão que a
sua vaga para estacionar estará logo á sua frente.
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